quinta-feira, 28 de setembro de 2006

Aborto e discriminação II

Notas adicionais.

O direito ao aborto representa a reivindicação de que o corpo em que o feto reside é propriedade da mãe e que a soberania sobre essa propriedade implica a capacidade de expulsar o feto dessa propriedade.

Embora quem defenda a despenalização não seja (hipócritamente?) capaz de o equacionar desta forma, creio que um pouco de reflexão conduz a que não exista outra caracterização.


Na verdade, também os pais por vezes abandonam os filhos ou dependentes porque, e consistentemente com o direito de soberania, ninguém pode ser obrigado a manter dentro da sua propriedade e consumindo recursos alheios, alguém contra a sua própria vontade.

Também acho que ninguém tem dúvidas que falamos de actos da mais profunda imoralidade. Mas o que está em causa é da sua validade ética-legal de o fazer.

A direita tende a pretender ilegalizar a imoralidade, a esquerda a não só "legalizar" como a proibir depois qualquer forma de discriminação privada por terceiros baseada em julgamentos morais.

A contradição à esquerda é:

- pretender reivindicar um acto de soberania baseado em conceitos de propriedade e da mais pura discriminação que resulta da expulsão do feto.
- ao mesmo tempo que pretende a todo o tempo defender de forma absoluta o igualitarismo e proibição da discriminação privada.

À direita:

- a tentação de usar o sistema legal para impor moral abre o caminho a todo o tipo de intervencionismo e em todos os domínos com argumentos similares, incluindo, a invasão do espaço da família, a educação, etc.

Qual parece ser o papel do Liberalismo?

1. Fazer notar que representando o aborto talvez a forma mais extrema de reivindicação de soberania do proprietário e a sua capacidade de discriminar/expulsar, existem muitos mais domínios onde seria muito mais inócuo tal ser praticado.

Exemplos: Empresas discriminarem contra fumadores, condomínios contra detentores de animais, restaurantes chineses contra empregados não-chineses (ou já agora, restaurantes que só pretendem louras...), etc

Além disso, parece-me óbvio que se a mãe tem essa capacidade, também teremos de aceitar que outros proprietários (condomínios, empresas, etc) possam discriminar (nem é que preveja que tal fenómeno ganharia grande expressão prática, falamos aqui é de princípios) contra ... quem pratica o aborto.

2. Na realidade política concreta e tendo em conta que a descentralização representa a aproximação da capacidade de auto-regulação às comunidades concretas, devem ter as entidades locais capacidade de regular, dentro de determinados parâmetros, as suas escolhas.

Assim, tal com em tempos existiram "Municípios livre de nuclear", poderiam estes simplesmente decretar (via referendo local?) que não são "Municípios livres da prática do aborto", não se trata de "ilegalizar"/"criminalizar", mas apenas de regular a sua não prática no "seu" local.

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