sexta-feira, 1 de agosto de 2003

Devir municipal e "generais de pijama"

Gostaria de comentar dois assuntos da actualidade: a não promulgação pelo presidente da República do acto legislativo que eleva Fátima e Canas de Senhorim a concelho e o "jantar contestatário" dos generais, ocorrido ontem em Lisboa.

No primeiro caso, concordo com a atitude do presidente Sampaio, tanto pelas "irregularidades processuais" cometidas pelo Parlamento como pelo facto de ser contra a criação de mais concelhos - não se pode andar a dizer, para justificar a criação de regiões administrativas no continente, que os concelhos são unidades territoriais demasiado pequenas para funções de governo descentralizado e simultaneamente fragmentar-se ainda mais a estrutura municipal do País (no caso de serem necessárias unidades maiores, que se façam as flexíveis federações de concelhos que a própria Constituição prevê e, no caso de haver excessiva centralização de funções dentro de grandes concelhos, que se invistam as freguesias existentes ou outras a criar de parte dessas funções). O poder municipal tem de ser forte e isso é incompatível com mini-concelhos ou com uma geografia variável ao som do tambor do poder central (Governo e Parlamento); por outro lado, acho inadmissível que o poder central divida concelhos cujos órgãos próprios se manifestaram contra essa divisão...

Quanto ao "jantar contestatário", discordo inteiramente da atitude dos generais. Por muito que o ministro da Defesa tenha cometido algum deslize (p.e., não consultando uma chefia militar sobre determinado assunto), não me parece próprio esta forma de o desafiar e desautorizar publicamente - alguém vê militares britânicos ou norte-americanos, mesmo que cobertos de razão, terem estas atitudes para com as suas "tutelas" civis? Eu bem sei que a nossa Academia Militar não é Sandhurst ou West Point e o problema talvez radique aí mesmo... Se se tratou de um deslize do ministro, os militares devem saber usar os mecanismos institucionais e a discrição para se fazerem ouvir; se há discordâncias em termos de opções políticas com o ministro, o chefe do Estado Maior do Exército poderia pedir a demissão, como fez, mas não deveria deixar-se envolver em jantarzinhos de "desagravo" que emitem comunicados indignados e verbalmente inflacionados. Infelizmente, em Portugal, os militares não têm grande tradição deste recato inspirado por uma cultura legalista e tendem facilmente a comportar-se como mais uma corporaçãozinha...

Sem comentários:

Enviar um comentário