domingo, 13 de março de 2005

Destaques

1) Jaime Nogueira Pinto em "A (re)fundação da direita (1) " no Expresso, cita Russel Kirk "...dizia que «as ideias têm consequências» ...Olhando os resultados do «centro-direita», eu diria que a sua falta (das ideias) também!"

[Nota: e como era bom que existisse uma direita portuguesa atlantista mas alternativa e mais imune ao neoconservadorismo - onde certas ideias se arriscam a terem consequências que as tornam próximas de Napoleão e Trotsky - e que pudesse rever-se no conservadorismo tradicional americano (e que ao contrário do europeu tradicional contém muitos princípios liberais clássicos, por um lado, mantendo o pessimismo em eleger a vox populli a qualquer fim em si mesmo, por outro) de Russel Kirk e Robert Nisbet]

No fim, JNP estabelece alguns princípios gerais:

"
Não sei se estes valores são património exclusivo da direita. Por mim, penso que a defesa dos princípios cristãos, do valor da nação como comunidade solidária dos cidadãos e da família e da propriedade ...

[esta sentença tem muito de Robert Nisbet, que dizia ser a reverência à propriedade , como um elemento de continuidade e ordem, uma das características obrigatórias da sensibilidade conservadora e que torna possivel a soberania da familia e comunidade - o que por sua vez faz com que essa sensibilidade olhe com desconfiança para qualquer intromissão nesses domínios por parte de qualquer poder político - visivel na Idade Média e no Feudalismo até ao advento do absolutismo antigo e do novo - o do Estado Moderno. Eu diria que o problema da direita actual é ter capitulado perante o centralismo e por culpa própria, porque caiu na falácia de ver nesse centralismo um meio de proteger a sua "familia, comunidade e propriedade" - o problema é que depois de criada essa fonte de poder, foi depois tomado de assalto adoptadas outras prioridades - o igualitarismo, relativismo, etc]

da sua liberdade. Esta é a direita com que me identifico - patriótica, realista, solidária, livre, mas consciente de que o bem comum existe e é superior à soma e à subtracção dos bens e interesses individuais"

2) João Carlos Espada, num artigo intitulado de "Burke e a tradição anglo-americana da liberdade" fala de Edmund Burke que "condenou todas as tentativas políticas ou governamentais de redesenhar a ordem social com vista a fazê-la conformar com um visão abstracta. Fê-lo em defesa dos direitos dos católicos irlandeses, em defesa dos colonos americanos, em defesa dos súbditos nativos da Índia sob administração inglesa; e finalmente, em defesa da liberdade dos franceses contra o despotismo iluminado dos jacobinos"

Burke era também prudente quanto ao crescimento do Império Britânico (já agora Burke nasceu em Dublin o que provávelmente contribuiu para o capacitar de apreciar e criticar...). Nos dias de hoje talvez se afirmasse que alguém como Burke apoiava causa separatistas (e quem sabe até "terroristas" - afinal a revolução americana, como as lutas irlandesas...), mas o essencial não está nas classificações (ou seja, de "separatismos" em si) mas num correcto julgamento:


"...The surge in royal executive power during the 1760’s and 1770’s alarmed the colonists and they feared that their way of life might be destroyed. In order to preserve their "English liberties" as they called them, the colonists decided to withdraw from a governmental entity they saw as a threat to their value system. They did not wish to engage in regicide or to indulge in vengeful slaughter. They only sought to conserve a system they feared would be taken from them. Edmund Burke saw this clearly from the Parliament in London. Burke could appreciate that American politics, American values, and even American religion was not like that which existed in England. As the conflict drew on, Burke predicted that if the British were to win the war, the American colonies would have to be remade in a new image in order to remain a part of the British Empire. That which made America what is was would have to be expunged from the earth. Burke did not wish to revolutionize America or anywhere else. The fact that Burke supported the American Revolution while condemning the French Revolution is a compelling fact. While the French Revolution sought to overturn and destroy an established order, the American Revolution sought only to conserve an established order which was being destroyed by British intrusion. " (1)

Eu acho que tudo o JCE diz é correcto, só não tenho a certeza que Burke embarcaria no actual cruzeiro neoconservador (nem cruzada) e porventura seria mais prudente em reclamar mudanças aceleradas induzidas exógenamente (e na ponta da baioneta) a bem de uma nova ordem mundial (até porque quem pediu uma Nova Ordem Europeia, utilizando a força, a mudanças de regime, a influência na escolha de governantes de terceiros, etc, foi Napoleão). Creio mesmo que nem no conflito israelo-palestiniano podemos ter a certeza que os seus olhos veriam com a mesma simplicidade de quem costuma caracterizar um conflito por domínio territorial como de sendo de "democracia versus terrorismo" ou coisa do género.

Edmund Burke apreciava a imagem dum "...English garden, a parable for a decentralized, diverse and lovely place where individuals and families and communities produce, create, and find joy – as they work to gently govern themselves in ways that satisfy their higher values, culture and tradition – is never found in statist "order."
(2) o que elege como qualquer liberal clássico sem antagonismo com a tradição ainda que preparado para advogar a mudança com realismo, tendo dito “change is the means of our preservation".

E por isso mesmo, JCE fala de Burke como o "primeiro teorizador dos partidos políticos parlamentares modernos" (se bem que não sei se é mais adequado falar do parlamento em si mais do que em partidos).

JCE diz que "Gertrude Himmerfarb sugeriu recentemente que esta ideia de um poder central unitário, intérprete infalível da razão contra os interessses particulares dos indivíduos e das instituições particulares, permeia todo o pensamento francês do século xviii"...e acaba mais À frente com "...porque são os povos de lingua inglesa os primeiros a levantar-se em defesa...".

Eu observo apenas que da cultura francesa saiu muito do pensamento liberal clássico e também da produção de teoria económica, muita dela, antecedente da Escola Austriaca (que corrigiu alguns rumos da teoria económica clássica com origem inglesa).

Diz em "
Richard Cantillon and the French Economists: Distinctive French Contributions to J. B. Say*" by Leonard P.Liggio, Institute for Humane Studies George Mason Universiry:

"...Stanley Jevons made reference to this supriority of the French over the English schocls in the Preface to the Theory of Political Economy:
The true doctrine may be more or less clearly traced to the writings of a sucession of great French economists, from Condillac, Baudeau, and Le Trosne, through J. B. Say, Deshin de Tracy, Stroch, and others, down to Bastiat and Concerlle Semeille.

(...) The Physiocrats were concerned to treat the economy as a natural phenomenon, a natural order, a process, in comparison to the mercantilists who emphasized the need for artificial and extraordinary government measures to achieve their objectives.

In this the Physiocrats were following the lead given by Cantillon. Starting with their foundation in a theory of property, the Physiocrats constructed a science around the natural harmony of interests. Property owners should be those or their heirs who cleared and drained land for its cultivation. From Cantillon's analysis, including his contribution on entrepreneurship, the Physiocrats derived their sense of harmony of interests. Le Mercier de la Riviere, L'Ordre naturel et essenciel des societes politique (1767), described how competition is the means by which diverse economic interests are reconciled.' According to Le Trosne, Del ínteret social (1777): It is competition which conciliates all interests: it is perfect only under the absolute reign of freedom of trade, which is the premier consequence of the right of pmperty, and in consequence one of the most essential laws of the social order.'


The Physiocrats shared with Cantillon a system of thought based on methodological individualism. Cantillon's assumption that autonomy of the individual leads to harmony of interests was suggested by Mandeville's Fable of the Bees."

Outro aspecto a propósito tem que ver com o papel da França na história das guerras: combateu a tentativa de hegemonia continental por Carlos V, foi a primeira a derrotar a Prússia (Napoleão), combateu a Alemanha de Bismarck em 1870, depois na Grande Guerra começou a mobilização mal a Rússia declarou guerra, e na Segunda declarando Guerra a Hitler por causa da Polónia sem ter um canal para a proteger...e não ficaria mal lembrar que a França foi o primeiro aliado da Revolução Americana (mais tarde, em 1812, James Madison declarou guerra à Inglaterra e quando esta se empenhava na luta contra Napoleão... tendo os ingleses conseguido incendiar Wasghinton").
O preço pago pela França foi, ao longo da sua história, sempre muito elevado, o que por vezes não custava nada ser reconhecido - em West Point o francês ainda é lembrado como a lingua das manobras militares (tal como os Prussos também a usavam) e hoje os neocons falam na criação de uma "legião estrangeira" que como não podia deixar de ser, só podiam (propor) baptizar de "legião da liberdade".


Talvez a América seja hoje, apenas uma nova França. Não que isso sejam boas notícias.

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