quinta-feira, 18 de dezembro de 2003

Re: ainda Saddam

Mais um pouco e este libertarian (Jonathan Wilde) assina por baixo no novo militarismo intervencionista de esquerda à la Tony Blair: o uso da força para livrar a terra de todos os tiranos.

E quem É que vai decidir quem É tirano ou não é? a ONU? os Neocons? Os liberventionists?

Este tipo de moralismo libertador tem muito pouco que ver com o espírito libertarian ou mesmo conservador. Vamos lá ser moralistas, mas à grande:

Os US foram aliados e forneceram Saddam de armas químicas e biológicas na sua luta contra o Irão (na altura, o inimigo eleito dos US, cuja causa foram 25 anos de apoio a Palhevi posto no poder pela CIA, contra eleições democráticas no Irão).

Os US estavam informados do uso de armas químicas por Saddam na Guerra com o Irão.

Na altura, o Embaixador Americano "aprovou" a invasão do Koweit. Existiam disputas sobre a prospecção de petróleo em território iraquiano e o Koweit furava as quotas das Opep num altura em que o petróleo estava nos 10 Usd e o Iraque saia falido da sua Guerra contra o Irão em nome dos países vizinhos e do "Ocidente" (Inglaterra, França e até Portugal e outros também forneceram Saddam).

Saddam esmagou revoltas separatistas no Norte (os turcos também sempre maltrataram os Kurdos) e Sul (a influência do Irão, e esta revolta foi incentivada por Bush pai no Golfo I). E parte das misérias e controle estatal nos anos 90 deveram-se às sanções impostas pela ONU, destruindo a classe média e prolongando a economia de guerra.

Se não tivesse existido o Golfo I, os países à volta seriam os primeiros a controlar Saddam a suas expensas, com toda a certeza um acordo teria sido conseguido (já iniciado pelo Rei da Jordânia), 2 guerras teriam sido evitadas, existiria maior contacto com o exterior e pressões internas para a mudança do regime. Mas não... somos todos muito apressados. E deu no 11/9, a presença no Afeganistão e Iraque, e a ascensão do fundamentalismo.

Muito mais haverá a dizer, mas não é certamente para desculpar Saddam ou fazer dos US o império do mal, apenas que convém não levar a hipocrisia a limites insuportáveis ou a um misto de ingenuidade e turculência libertadora revolucionária própria de comunistas à procura de fascistas em todas as esquinas, cegos e sedentos de qualquer coisa.

E então se os Iraquianos quiserem libertar Saddam? Imaginem que a maioria Sunita prefere Saddam à tomada do poder pelos shiitas? Exactamente o que é que este liberventionist é a favor ou contra?

O problema é sempre que a suposta justiça é feita por terceiros que se deviam meter na sua vida, torna-se difícil ter parâmetros de right and wrong. E então os outros tiranos do planeta, quem são? a Arábia Saudita? Pinochet e todos os ditadores apoiados pela política externa americana no séc. 20 (e 21: Paquistão)? E se o Iraque cair na Guerra Civil quem é que vai encolher os ombros?

Quem tem uma balança da justiça? Ninguém, deixamos isso às próprias populações. Na Roménia julgaram e condenaram à morte. Na União Soviética, o regime desabou, o conflito internacional desapareceu, não existiram perseguições moralistas impostas por terceiros à antiga administração, e se calhar os seus crimes são bem maiores do que os do regime de Saddam. Seria melhor que a USSR tivesse sido invadida militarmente (fazendo de conta que isso era possível) e julgado todos os dirigentes por potências terceiras?

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