terça-feira, 15 de novembro de 2005

História do Direito II

e as liberdades antigas...da Idade Média.

"Contudo, a vinculação do passado ao imaginário contemporâneo pode levar a consequências ainda mais sérias. Possívelmente, a uma total incompreensão do direito histórico, sempre que a sua própria lógica for subvertida pelo olhar do historiador.

Por exemplo, isto acontece quando se lêm as cartas régias que, na Idade Média, protegiam a inviolabilidade do domicílio (enquanto expressão territorial do poder deméstico) como antecipações das modernas garantias constitucionais de protecção da privacidade individual.

Na verdade, o que então estava em jogo era a autonomia da esfera doméstica frente à esfera política da respublica, no âmbito de uma constituição política pluralista, em que os poderes periféricos competiam com o poder central.

[nota: o aqui está em causa é a verdadeira liberdade: a da soberania na ordem doméstica, da sua propriedade, como realidade que está fora da gestão pública]

Bem pelo contrário, nada estava mais fora de causa do que a ideia de proteger direitos individuais, os quais eram então completamente sacrificados no próprio seio da ordem doméstica.

[nota: já aqui tenho comentado que é ao Estado que o individualismo radical, do tipo, independente de qualquer autoridade da sociedade civil - famila, comunidade, religião, etc - deve tudo - incluindo a capacidade de não depender dessa sociedade civil porque o Estado tudo fornece e todos os direitos positivos garante]

Outra ilustração do mesmo erro seria uma leitura representativa (no sentido de hoje) das antigas instituições parlamentares (as «cortes» ibéricas ou os parlamentos franceses do Antigo Regime); embora se tratasse de assembleias que «representavam» o reino, a ideia de representação que aqui domina é, não a actualmente corrente na linguagem política, mas antes a corrente hoje no teatro - os actores tornam visíveis (apresentam públicamente) as personagens, mas não são seus delegados, seus mandatários, não exprimem a sua vontade(...) "

[nota: acho esta visão simplesmente deliciosa, quem não acha, se pensar bem nisso, como utópica, ingénua e pouco prática, que na Assembleia estão representantes com mandato no sentido civil? Muito mais verdadeira e prática assumir que o papel da Assembleia é "representar" para tornar "visivel" o que a população é, se queixa, etc, permitindo ao poder assim tomar contacto com a comunidade]


em a " Cultura Jurídica Europeia - Síntese de um Milénio" 3ª edição, António Manuel Hespanha

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