sexta-feira, 2 de fevereiro de 2007

Aborto e outros dilemas morais

1. Não deve ser crime

1.1. A explicação ética é que seja qual fôr o julgamento moral que se faça, corresponde ao exercício de de um direito de expulsão de um feto do corpo da mãe, como um proprietário o faz ao seu hóspede (se as palavras chocam, talvez o "SIM" deva reflectir sobre aquilo que defende, até porque no seu campo, existem muito pouca gente a quem a liberdade individual e direitos de propriedade sejam valores que não desapareçam no seu conceito de interesse colectivo e defesa do mais fraco).

Se um dia fôr técnicamente e económicamente possível sustentar um feto desde as primeiras semanas, nestas condições, se o acto de expulsão, e por escolha deliberada, resultar na perda de vida, em vez de recorrer à possibilidade de ser sustentado por um terceiro que pretenda assumir a responsabilidade, este acto em si poderá de facto configurar um acto com bem mais argumentos (ou argumentos acrescidos) de criminalização.

1.2. A explicação utilitária é que a sua criminalização não é eficaz e a tentativa de colocar o aparelho judicial do Estado a combatê-lo eficazmente constituirá uma intromissão intolerável (como um dia o poderá ser quando o Estado eleger a emergência pública o problema da natalidade, sendo previsível não só a sua proibição como por exemplo, o registo compulsório de todas as grávidas e demais actos para vigiar as boas condições de nascimento).

2. Deve ser passível de ser proibido localmente

2.1. Éticamente os proprietários têm o direito a regular a sua propriedade. Mas como existem comunidades locais não constituídas sobre a forma de propriedade privada colectiva (talvez um dia) mas sim com existência político-administrativa, estas devem poder proibir ou regular as actividades morais, ainda que não ilegais, mecanismo pelo qual a sociedade civil se confronta e equilibra com diversidade e não com imposições centrais de neutralidade moral absoluta (ou assim dizem).

O Estado, recorde-se proibe (ou prepara-se para) de forma centralizada, actividades não criminosas (ex. fumar) e em propriedade privada (esta última, muitos diriamos que de forma ilegítima). Como não conferir a capacidade não concertada e independente, de localmente o fazerem também?

2.2. Porque é muito mais eficaz a actuação da sociedade civil de forma descentralizada em especial quando essa actividade passa a ser praticada abertamente, tendo em conta que o aborto é passível de ser praticado de forma quase anónima.

3. As escolhas sobre uma liberdade devem ter em conta todas as liberdades

No ponto 1. e 2. podiamos estar a falar de droga ou prostituição. Mas como todas as questões morais, é especialmente essencial que seja possível a sociedade civil exprimir a sua diversidade, podendo as suas preferências serem expressas através de regulação local e ostracismo privado (Exemplo: restaurantes que por iniciativa do proprietário proibem fumar aos empregados e aos consumidores), notando que o mesmo direito de associação que permite a capacidade de reunião qualquer grupo homogéneo com um determinado valor excluindo quem não os tem (ex: associações gay), confere também o direito de associação de outros.

Se o ponto 2 não existe sob forma alguma, qualquer decisão em 1 resulta numa imposição universal de um ponto de vista moral a toda a sociedade civil. É assim essencial que exista uma capacidade descentralizada, a que podemos denomizar de federalismo moral localista, de expressão democrática limitada (isto é, territorialmente).

A moral exerce-se com o exemplo e com o confronto de exemplos e atitudes individuais, e muito importante, comunitárias e associativas, que devem ser expressas nas suas unidades e não no todo territorial imposta por referendos universais.

Sem comentários:

Enviar um comentário