Sobre o projecto de tratado que alguns querem impropriamente metamorfosear em "constituição" europeia, o Prof. Jorge Miranda (um dos "pais" da actual Constituição da República Portuguesa) voltou ontem no "Público" a pôr os pontos nos ii: o tratado é um tratado e não pode ser uma "constituição"! Para haver constituição, tem de haver poder constituinte - e onde está ele? Está obviamente disperso pelos ordenamentos jurídicos próprios dos vários países europeus e "cristalizado" nas respectivas constituições, as quais se assumem explicitamente como soberanas e apenas sujeitas a tratados internacionais voluntariamente aceites; é o que dizem as leis supremas dos nossos países. Deste modo, sem mudanças constitucionais profundas nos Estados membros da U.E., a aprovação dessa pretensa "constituição" assemelha-se em tudo a um golpe de Estado, a um acto puramente inconstitucional.
Sobre o referendo, Jorge Miranda também defende a boa doutrina (e a Constituição da República): nenhum referendo pode incidir ou decidir sobre tratados entre o Estado português e outros Estados, por mais que o tratado em causa apareça travestido daquilo que juridicamente não pode ser (uma pré-"constituição" que se apresenta a promulgação plural ou a plebiscito). O referendo é, pois, uma questão secundária e mal colocada - mas que emerge do facto deste tratado proposto também estar juridicamente mal colocado.
Em todo o assunto deste detestável tratado, nós estamos perante uma tentativa de completa subversão não só do nosso ordenamento constitucional mas de todas as regras, de toda a lógica, do Direito; é a federação europeia que nos querem impingir a nascer contra as mais elementares regras do Estado de Direito. Os federalistas podem querer fazer o seu super-Estado, mas ainda existem conceitos jurídicos para se articularem dentro de uma lógica discernível e ainda existem leis preexistentes que têm de ser respeitadas.
Um pedido aos políticos: pelo menos, entreguem este problema a juristas sérios!
Um pedido ao Presidente da República: o senhor, que jurou a Constituição da República Portuguesa e que deve pôr acima das suas preferências políticas esse alto compromisso, requeira às altas magistraturas do Estado a fiscalização da constitucionalidade deste tratado pseudo-constitucional.
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